19 de novembro de 2006

Fim-de-semana em Lisboa, tendo como desculpa o PhD

1º Relato: O leitãozinho é um animal amoroso, o leitãozinho...



Os cenário é uma festa de aniversário de uma criança. A família está reunida.Convidou-se tios, primos, avós, madrinhas e padrinhos. A criança enfia o leitor de mp3 nos ouvidos, ao mesmo tempo que tem o olhos fixos na Floribela. A criança, uma menina, anda agora no 2º ano, tem uma saia da Floribela e no leitor de mp3 ouve o "Vestido Azul".
A família, toda reunida, afadiga-se em torno do leitãozinho, manjar da ocasião. Não há sumos Tang a serem servidos. Não há torta de laranja, nem travessas de arroz doce. O irmão da menina ocupa-se também: ora com o leitão, ora a derrubar uma torre de Legos.
- É um animal amoroso, o leitão, rosadinho, tão bonito.- diz a tia, muito magra. Será que a tia, assim tão magra, gosta da pele tostada, ainda a saber a leite do leitãozinho?
De repente, começa a algazarra: toda a família discute qual a melhor receita para cozinhar o leitão: à moda da Bairrada? à moda de Negrais? ou à moda de Freixo-de-Espada-à-Cinta? Que temperos? Que quantidades? Que truques? Que temperatura do forno? Tantas dúvidas. Tantas.
Os membros da família falam: de impostos, da desgraça que está a ser o governo Sócrates, de como ela tem o fogão tão limpo e de como a irmã é uma doidivanas e tu ainda solteira - e se pagas mais impostos, então o problema é teu. (Antes solteira do que um marido alcóolico, terias respondido tu, se fosses eu).
Sai o leitãozinho do forno, com a sua tenra orelhinha queimada das brasas. Zanga-se a família, assim impedida de apreciar essa delicada orelhinha.
Vens embora para casa. Suspiras pelas sandes de leitão na área de serviço da Mealhada, comida em sossego. O leitãozinho é um animal amoroso; a família um animal tenebroso.



2º Relato: Os Idiossincráticos

Estamos os três sentados no sofá, a fingir que vemos televisão. Eu na parte da chaise longue, estendida. A Ana na ponta, encolhida, debaixo da manta de polar. O Zé Almeida a meio, a dizer disparates que vogam entre o último livro de auto-ajuda que anda a ler, o facto de ter tirado 18 na cadeira de Terapia Familiar e outras coisas que não nos interessam. Damos connosco a falar daqueles que se juntaram ao Dark Side of The Force, que é como quem diz... aqueles que se casaram. Damos connosco, embora nunca o digamos, convictos na nossa solteirice. Falamos das nossas pequenas picuinhices: das dedadas que irritam a Ana, do tocar nos papéis do banco que o irritam a ele, das almofadas do sofá fora do sítio que me irritam a mim. Falamos das coisas que já não nos irritam, que já não nos maçam. Perguntamo-nos: seremos capazes de baixar a cancela e deixar alguém entrar neste nosso reduto idiossincrático? E se sai destruído? E se deixamos de ser nós?



3º Relato: Sabamingo

Acordar muito devagarinho, pelas 11h. Sair da cama e rebolar até à cozinha. Pequeno-almoço. Primeiro cigarro. Duche. Compras de fim-de-semana. Almoço. Meter no carro e ir à Fnac do Colombo. O Colombo cheio de gente, porque é a crise e o Natal, tudo ao mesmo tempo. Meter no carro e ir ao Saldanha ver um filme. Escolhe-se o Diabo veste Prada, porque a mim não apetece dar para o peditório do cinema português. O filme corre mal e o nosso neurónio ressente-se. Ana tem saudades. Eu também. Acabamos, chateadas que nem perús, num sábado à noite, no restaurante chinês de Alverca, entre um bando de adolescentes a comemorar um aniversário e um casal a olhar para o desafio de futebol na televisão. Espanta-me este casal: ambos do mesmo lado da mesa, olhos fixos no écran... será que não têm Sport Tv? Estranho... Estranho.
Enfiamo-nos em casa. Último cigarro. Chá antes de dormir.
Acaba-se o fim-de-semana.
É hora de regressar à vida real.


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