7 de abril de 2008

A Princesa e a Ervilha


(Andersen, Hans Christian. The Snow Queen and Other Stories from Hans Andersen. Edmund Dulac, illustrator. London: Hodder & Stoughton 1911.)


Dias de vento a bater a chuva - nada parecidos com os do fim-de-semana e a nação já em funiscas! - lembram-me sempre a Princesa e a Ervilha, história que intrigou toda a minha infância, desde o momento em que aquele livro da Majora me chegou às mãos.
É que a Princesa batia à porta do palácio num dia assim, ventoso e chuvoso, enquanto no piso superior o rei e o príncipe disputavam uma partida de xadrez.
Naturalmente, o aspecto que mais me fascinava no livro eram as ilustrações. As princesas pretendentes, a Princesa e a rainha - todas tinham fantásticos vestidos de saia em balão, cascatas de cabelo, pequenas tiaras enfeitando a cabeça. E uma miúda sempre gostou de imaginar que era uma princesa. Havia outra ilustração - do príncipe a jantar com a princesa - e uma sobremesa, com uma cereja no topo despertava a minha gulodice.
Mas depois, todo o livro era incompreensível: como é que raio uma ervilha podia incomodar alguém? Ainda por cima uma ervilha metida no meio de mil colchões? Como é que a Princesa subia para a cama? Era preciso um escadote!
A minha mãe explicou-me: a Princesa era muito delicada, por isso, qualquer coisa a incomodava. Fiz de conta que acreditei, apesar de achar essa justificação quase inacreditável. Bastava olhar para o desenho para perceber que era impossível, com aquele monte de colchões, uma ervilha fazer mossa! Se ainda fosse um calhau! Agora uma ervilha, verde, tenra e deliciosa, igualzinha às que havia na sopa da minha avó! Impossível.
Só muito depois percebi como as coisas pequenas e quase imperceptíveis são suficientes para nos desequilibrar. Por vezes, chegam a ser piores do que um calhau - como é maior, encontramo-lo melhor e removemo-lo melhor do caminho. Que é como quem diz, de debaixo do nosso colchão.

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