23 de julho de 2008

Post em que a autora (de esquerda) de repente se revela uma reaccionária (de direita)

O arrumador de carros, de unhas nojentas e cor encardida, tem um telemóvel na mãos. Escreve um sms. Como é arrumador de carros, tem unhas nojentas e cor encardida, e não paga impostos, dou-lhe uma moeda de 1 euro, pensando, a medo que devia dar-lhe 50 cêntimos, porque a crise é para todos: uma moeda de euro, sem impostos, não paga pelo menos um duche? Talvez não. Talvez o encardimento pertença à personna. Talvez fiquemos sem pena e não demos dinheiro a um sujeito de cabelos limpos e barba feita.
Talvez ele, coitado, tenha um telemóvel com um daqueles tarifários muito baratos, 1500 sms à borla, chamadas à borla, etc., e precise muito de contactar com os seus fellow arrumadores, provavelmente para organizarem uma marcha lenta, exigindo melhores donativos voluntários e water closets: uma sanita e um chuveiro - embora isso, claro, lhes destruísse as personnas, interferisse com a sua identidade e especificidade cultural.
Desculpem-me leitores por me sentir assim, extremamente reaccionária.
("Reaccionário" é uma das palavras favoritas do meu pai, que ainda domina toda a retórica revolucionária e da Reforma Agrária, embora, desde há muito tenha deixado de ser comunista praticante para ser simplesmente do contra).
Desculpem-me: mas quando leio notícias como esta, não consigo tomar as dores dos pobres excluídos. Foram decerto os ciganos que construíram as barracas, que agora arderam. Pergunto-me porque é que, face à antiga indigente diligência, tenha uma Câmara Municipal, um governo, um grupo de cidadãos beneméritos de realojar os desgraçados!
As diferenças culturais e étnicas são muito engraçadas, porque raramente funcionam nos dois sentidos. Se a Câmara Municipal realoja os pobres excluídos era pelo menos obrigação dos desfavorecidos zelarem pelo património que lhes é confiado: em vez disso, transformam a casa de alvernaria em "barracas", em que o saneamento básico, a cozinha, os quartos são desnecessários e supérfluos. Para quê um fogão e um forno, se em seu lugar se pode fazer um magnífico lume de chão para assar um chouriço? Nada a recear: são idiossincrasias culturais.
Portanto, se as Câmaras e o Governo querem ajudar estes pobres desgraçados a única solução é distribuirem às famílias ciganas umas tendas-iglo. São barracas, não têm saneamento, nem divisões e são uma óptima opção no caso dos desgraçados quererem ir manifestar-se em frente a uma qualquer edilidade ou parlamento. A casa sempre com eles, eles sempre com a casa, recuperando as raízes nomádicas, respeitando as suas especificidades culturais e de modo de vida.
Tudo acabava em bem.

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