21 de dezembro de 2008

(Anunciação)

Só é verdadeiramente Natal quando somos crianças: todos nós um jesus pequenino.
Gostava ainda de pôr o sapatinho à chaminé. Acordar na manhã de 25 e ver o sapatinho a abarrotar de prendas pobres - como o meu primeiro livro da Anita ou sombrinhas de chocolate Regina.
Gostava ainda de ir visitar a minha bisavó Sabina e mostrar-lhe as minhas prendas pobres e estar feliz com isso. A avó Sabina nunca comemorava o Natal, porque o filho mais novo tinha morrido por essa altura. Na casa dela nunca havia doces, porque a tia Margarida é diabética. Diriam ambas "Olha a nossa Mena" - e eu era um menino jesus pequenino e tudo fazia tanto sentido.
Gostava ainda de almoçar em casa da minha avó Guilhermina e do meu avô Manel. O meu padrinho havia, ainda, de me dar palmadas nas costas. E o almoço seria sopa bonita - ervilhas, massas estrelinhas e ovo boiando no caldo; ou aquela sopa dos quadradinhos de pão frito. A minha avó ainda faria o pudim flã e eu seria estupidamente feliz.
A minha avó Gabriela estaria ainda viva. E eu lamentaria não lhe ter herdado os olhos azuis-esverdeados. A minha avó pastorinha, atrás do rebanho, sempre tão preocupada com o meu avô, que quando de-existiu e mirrou na cama do hospital, só lamentava morrer porque o deixava sozinho.
Quando se cresce e fica adulto, o que resta do Natal?
Inventaram-se centros comerciais. Toda a gente pressionada a comprar e a consumir e a ser feliz. As prendas de Natal nada mais são do que objectos para disfarçar o vazio.
Sei, leitores, que o meu discurso parece sempre desencantado e que vos dou a ideia duma pessoa a resvalar para o cinismo.
Mas é verdade: só é verdadeiramente Natal enquanto somos pequenos, todos nós um jesus pequenino.
Talvez seja Natal de novo quando somos Maria e José, olhando um menino jesus.
Mas vós, leitores, bem sabeis qual a minha opinião acerca das crianças. Sabeis como o amor infinito me magoa por dele me saber tão capaz.
Se disserem: "Não sejas parva", olhando-me no fundo dos olhos e trazendo-me uma criança para adorar, esconder-me-ei de vergonha. Não tenho nem playstation, nem brinquedo para lhe dar: e a ternura das minhas mãos sempre me deixou embaraçada.


1 comentário:

Anónimo disse...

Oh my love, como diria o Óscar, 'o amor é um sacramento que devíamos receber de joelhos e dizer Dominus non sum dignus com os lábios e com o coração'...