10 de dezembro de 2010

Rua Luís de Freitas Branco

Para aqueles que partilharam comigo os melhores anos
 
Quando cheguei a Lisboa, aos 18, foi quando nos mudámos para a Rua Luís de Freitas Branco. Era um quarto andar. À tarde ouviam-se lições de piano, vindas de um dos andares debaixo e, numa janela num prédio das traseiras, cinco anos a fio, esteve um rapaz debruçado sobre um Código Civil ou uma Anatomia de Grey, estudando com desvelo.
Não sei o que ele ouvia enquanto estudava.
Eu sintonizava o rádio-despertador na Rádio Cidade; as outras miúdas também. Havia lá coisa mais linda que o Cidade By Night e aquelas canções xaroposas? O rapaz que vivia connosco talvez ouvisse Zeca Afonso ou Sérgio Godinho, porque era militantemente de esquerda.
Na cozinha, pusemos um dia um rádio com leitor de cassetes. Ouvíamos, à vez, a discografia de Marco Paulo e as emissões da Antena 2. Conseguíamos combinar assim o popular com o erudito. Não rejeitávamos as nossas raízes rústicas, mas tentávamos poli-las com os ensinamentos de Concha de Mascarenhas.
Por isso, num dia de primavera em que chovia a potes e, inspiradas por uma rapariga que aparecera lá em casa com uma cassete do Kenny G. e intenções sedutoras para com o nosso companheiro de casa, compusemos Li Assassinato di Lenita: uma das árias seria teria acordes do “Não Vás ao Mar, Toino”, podes morrer Toino, etc.
Algures em 1999, meses antes de vir para Portalegre, ouvi na Antena3 a canção que fecharia a OST do filme da minha vida: Baz Luhrman – Everybody’s free (to Wear Sunscreen)
De resto, que outras canções estariam nessa OST? O Mark Kozelek deprimidíssimo, mas logo seguido do “Glitter and Be Gay”, cantado pela June Anderson ; Talking Heads; Antony and The Johnsons. Outras ainda por ouvir e aprender.
Tendo morado na Rua Luís de Freitas Branco, compositor português do século XX, nunca ouvi nada dele. Uma falha formidável! Portanto, ao ver anunciado na Agenda Cultura de Portalegre um quarteto de cordas que interpretaria Luís de Freitas Branco e Jolly Braga Santos, entre outros, não quis perder a oportunidade. Mas, sem explicações, trocaram o Freitas Branco pelo Haydn. Foi bonito, ainda que os músicos tivessem entrado mudos, saído calados e rematassem o concerto, já nos bastidores, tocando o tema do Super Mário.
Alas!, continuo sem nunca ter ouvido nada do homem que deu nome à rua onde descobri que música queria tocar na minha vida.

2 comentários:

Manuela disse...

Conseguiste salvar a coisa com a última parte do post.
Quando cheguei à parte das cassetes do querido Marco Paulo já as lágrimas me caiam cara abaixo e estava prestes a começar a soluçar. Mas depois cheguei à parte da ópera da fofinha Lenita Gentil e tudo passou.

Me parece que a Banda de Lavre toca algumas peças do Luís de Freitas Branco.

Se tens curiosidade em ouvir alguma coisa dele aconselho-te a Suite Alentejana N.º 2 que é muito bom. Está no Youtube!

Unknown disse...

Também a mim me levaste às lágrimas!
Aqueles ano ficarão para sempre... independentemente de udo o que aconteça...
Confesso que já não me recordava da ópera da Lenita Gentil... mas foram momemtos hilariantes!!:)

Fernanda