1 de fevereiro de 2009

Temporal

A chuva e o vento, quando se está confortável em casa, sublinham essa sensação de quietude interior.
Nada melhor do que ouvir o barulho das gotas esmagando-se na persiana.
A chuva e o vento trazem sempre lembranças quentes da infância.
(Um dia dir-me-ão: "És uma chata obcecada com a infância. Só sabes falar de ti. Que enjoo!")
Lembram-me sobretudo duas obras literárias fundamentais no meu percurso - Anita no Teatro e A Princesa e a Ervilha. Deste último, já aqui falei.
Em A Anita no Teatro, numa noite assim, as crianças refugiavam-se no sótão da casa - e aí descobriam - oh maravilha! - baús cheios de roupas antigas, com que se mascaravam e montavam uma pequena fantasia teatral.
Com tristeza, verificava que nos sótãos das minhas avós não se tinham acumulado vestimentas de outras eras.
Na casa da avó Guilhermina, o sótão era habitado por: pó, teias de aranhas, o meu carrinho de bebé, uma cadeira de barbeiro (dum tio que antes habitara a casa e que depois partira para a Amadora), tábuas pobres, o Velho do Saco e o Papão. Coisas sem grande interesse, no fundo. Era bem mais divertido o calendário (parado em que ano? ainda existirá?) do Vasco Gonçalves.
Não me lembro do que havia no sótão da avó Gabriela. Tenho uma vaga recordação de figos secos. E lembro-me das bochechas dela, luzidias e risonhas.
O sótão da avó Sabina não era bem um sótão, mas um andar por cima da casa. Um andar que só era aberto quando as filhas vinham (de Lisboa, de Setúbal) visitar. Nesse andar, uma mobília de verga e um álbum de fotos. Uma vez, quis formar um clube de meninas e instalar o clube lá. Mandaram-me bugiar.
Mas a verdade é que em noites como estas - chuva e vento lá fora - só me apetece subir até a um sótão, descobrir um vestido dentro dum baú, e transmutar-me em princesa de conto de fadas.

1 comentário:

Anónimo disse...

Em Lisboa (quase) não há sótãos, apenas arrecadações, quando muito... o que é pena pois acho isso da anita bem fofuxo. O meu referencial de sótão é apenas o dos filmes de terror, uuuu que medo...